Blogue de Literatura & Mitologia

12 de outubro de 2014

SÃO JOÃO BATISTA DO MODERNISMO BRASILEIRO: MANUEL BANDEIRA


1 - BREVE TÁBUA BIOGRÁFICA

Nascido aos dezenove dias do mês de abril de 1886, em Recife, Manuel (Carneiro de Souza) Bandeira, um dos mais notáveis poetas da literatura nacional, em todos os tempos, mudou-se, ainda criança, para a cidade do Rio de Janeiro com os pais. 
O futuro poeta passaria uma temporada em São Paulo e retornaria, à terra natal, Pernambuco, em 1892. Entre idas e vindas, Manuel Bandeira acabou por fixar moradia na antiga capital federal, no início do século XX, onde se tornaria, mais tarde, um dos mais promissores poetas da nova safra de escritores brasileiros com a eclosão do movimento modernista em 1922.
Manuel Bandeira, acometido por uma tuberculose, ainda na juventude, esteve na Europa, mais especificamente na Suíça para tratamento. No entanto, com o advento da Primeira Guerra Mundial, o escritor retornou ao Brasil em 1914. A doença, que o acompanhou por muito anos, influenciou, sobremaneira, a sua poética, que expressou, por conseguinte, a angústia e a dor, em seus poemas, além do sentimento de nostalgia e de solidão.
A partir da deflagração do Modernismo, em 1922, com a Semana de Arte Moderna, ao lado de Oswald de Andrade e Mário de Andrade, o jovem artista formaria a tríade mais importante dos escritores em ascensão e de grande relevância no painel das letras nacionais, marcando, de forma ímpar, a primeira fase da referida estética no Brasil.
Com a leitura do poema Os Sapos, Manuel Bandeira estreava no cenário da literatura brasileira, na abertura da Semana de Arte Moderna. O poema tinha um objetivo inconfundível: ridicularizar o Parnasianismo, de cujas águas o poeta bebera e da qual se libertara para emblematizar a sua presença, com uma poesia que retratava o cotidiano e que trazia em sua escrita a simplicidade, um dos pontos nodais da renovação modernista em oposição a um tradicionalismo literário, caracterizado pela exacerbação das formas e da rigidez da linguagem das estéticas antecedentes, que primavam pelo rebuscamento e pela elitização do texto poético.


2 - AS CIDADES NA VIDA DO POETA




                                                             Recife



Rio de Janeiro 











São Paulo 

3 - O POETA E O MODERNISMO






A poética bandeiriana constitui-se um caso ímpar na literatura nacional e, sobretudo, no modernismo brasileiro. O escritor, um dos pilares da nova poesia brasileira, embora emergisse ao lado de vultos históricos, como os Andrades, os paulistas, Mário e Oswald, dentre outros,  na proclamação da corrente estética homônima, não tivera um comportamento aguerrido, como seus pares, através das atitudes de enfrentamento e de ruptura com as tradições clássicas e tampouco protagonizou as severas críticas que os diversos artistas da primeira geração desferiram contra os autores nacionais do Simbolismo, Parnasianismo e Romantismo. Assumindo outra postura, o poeta preferiu, de forma espontânea, a ironia, em tons moderados, no início, para, posteriormente, espelhar em seus textos a pluralidade de temáticas, que confeririam, ao longo de sua vida, o tom modernista de sua obra. 
Assim, da experiência com a doença, a tuberculose, que poderia ceifar a sua vida, ainda na juventude; um certo nomadismo, ao mudar de cidades e residências, que concorreu, sobremaneira, para redimensionar a sua visão crítica e sensível acerca das realidades pelas quais passou; a sua origem humilde, por ser um nordestino; o amor, o saudosismo e a decadência, vivenciada e refletida em seus textos, culimando, ciclicamente, com a solidão de um homem, e a morte de todos seus entes, compuseram um painel de um cotidiano, cujos matizes traduzem a modernidade de uma obra literária, que, paradoxalmente, mescla traços libertários com estruturas clássicas, na poesia, e confere uma singularidade à escrita lírica e, também, prosaica, no turno do Modernismo, nas várias gerações, até o seu desenlace, em 1968, aos 82 anos de idade.


4 - A POESIA DE MANUEL BANDEIRA

Apesar de ter registrado em prosa diversos textos, entre ensaios literários, crítica e, também, crônica, Manuel Bandeira eternizou-se na literatura brasileira, através de sua poesia, de tonalidade ímpar, na esfera eclética e alvoroçante do Modernismo de 1922. O poeta destacou-se entre os demais por romper com a tradição e elevar-se, de forma primorosa, ao usar os versos livres em seus poemas, em detrimento da metrificação, sendo chamado, portanto, de Mestre do Verso Livre no Brasil.
O escritor iniciou sua trajetória literária na poesia parnasiana, alcançou o patamar de grande poeta no Modernismo e teve, também, forte influência da poesia simbolista. É importante ressaltar, neste sentido, que a genialidade do poeta não foi abalada pelo fato de o movimento modernista, na primeira fase, ter privilegiado substancialmente a prosa, ao contrário da lírica, que, tardiamente, ocuparia um espaço singular na literatura nacional.  


5 - AS OBRAS

Em 1917, Manuel Bandeira publicou seu primeiro livro: Cinza das Horas, abrindo as portas para uma produção poética, que compreenderia a prosa, além da poesia e as antologias. Em 1919, o poeta lançou Carnaval, o que marcaria, definitivamente, sua participação no grupo ascendente de artistas ilustres e que, posteriormente, consolidariam o movimento modernista em 1922. 
Com a publicação da obra Libertinagem, em 1930, Manuel Bandeira alcançou o status de grande escritor modernista, ao apresentar, em sua poética, temas marcadamente relacionados à referida corrente estética, de linguagem coloquial, cuja sintaxe dista das normas cultas, além da recorrência aos temas folclóricos. 
Ao contrário dos ideólogos do Modernismo, Manuel Bandeira adotou uma postura exemplar e distinta na Semana, que apregoava, cristalinamente, a tese de que o rompimento com as tradições vigentes era condição sine qua non para o estabelecimento da referida estética bem como a crítica voraz e impiedosa às correntes literárias, que não se identificavam com realidade nacional. Assim, o poeta não atacou os parnasianos e tampouco os simbolistas, como fizeram os modernistas, pois suas obras tiveram forte influência dos períodos homônimos.
Em sua poética, presentificam-se os temas concernentes ao amor, à vida, à solidão, à angústia, à infância, à morte, entre outros.


5. 1 - POESIA

A cinza das horas
O ritmo dissoluto
Libertinagem
Estrela da manhã
Poesias escolhidas
Poesias completas
Lira dos cinquenta anos
Poemas traduzidos
Mafuá do malongo
Obras poéticas
Alumbramentos
Estrela da tarde

5.2 - PROSA

Crônicas da província do Brasil
Guia de Ouro Preto
Noções de história da literatura
Autoria das cartas chilenas
Poesia brasileira (apresentação)
Literatura Hispanoamericana
Biografia de Gonçalves Dias
Itinerário de Pasárgada
De poetas e de poesia
A flauta de papel
Prosa completa (reunião)
Ensaios literários
Crítica de Artes
Epistolário
Andorinha, andorinha (crônicas)
Os reis vagabundos e mais (crônicas)
Colóquio unilateralmente sentimental (crônica)

5.3 - ANTOLOGIAS

Antologia dos poetas brasileiros da fase romântica
Antologia dos poetas brasileiros da fase parnasiana
Antologia dos poetas brasileiros bissextos contemporâneos
Organizador dos sonetos completos e poemas escolhidos de Antero Quental
Obras poéticas de Gonçalves Dias
Rimas de José Albano e Mário de Andrade
Cartas a Manuel Bandeira

































6 - POEMAS

VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
La tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei -
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada


POEMA DO BECO

Que importa a paisagem, a Glória, a baía
a linha do horizonte?
O que vejo é o beco.


TERESA

A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.


O PORQUINHHO - DA - ÍNDIA

Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...


OS SAPOS

Enfunando os papos,
Saem da penumbra, 
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado, 
Diz: _ "Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com 
Consoantes de apoio.

Vai por cinquenta naos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem dandos
A fôrmas a forma.

Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mias poesia,
Mas há artes poéticas..."

Urra o sapo-boi:
_ "Meu pai foi rei!" - "Foi!"
- " Não foi!" - "Foi!" - " Não foi!".

Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- A grande arte é como
Lavor de joalheiro.

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo".

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".

Longe dessa grita, 
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;

Lá fugido ao mundo, 
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...


PNEUMOTÓRAX

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.

- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
- Não.  A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.


POÉTICA

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja
fora de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante
exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes
maneiras de agradar as mulheres etc
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare 
- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.


ESTRELA DA MANHÃ

Eu quero a estrela da manhã
Onde está a estrela da manhã?
Meus amigos meus inimigos
Procurem a estrela da manhã

Ela desapareceu ia nua
Desapareceu com quem?
Procurem por toda parte

Digam que eu sou um homem sem orgulho
Um homem que aceita tudo
Que me importa?
Eu quero a estrela da manhã

Três dias e três noites
Fui assassino e suicida
Ladrão, pulha, falsário

Virgem mal-sexuada
Atribuladora dos aflitos
Girafa de duas cabeças
Pecai por todos pecai com todos

Pecai com os malandros
Pecai com os sargentos
Pecai com os fuzileiros navais
Pecai com todas as maneiras

Com os gregos e com os troianos
Com o padre e com o sacristão
Com o leproso de Pouso Alto

Depois comigo

Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas comerei terra
[e direi coisas de uma ternura tão simples
Que tu desfalecerás

Procurem por toda parte
Pura ou degradada até a última baixeza
Eu quero a estrela da manhã



O Mestre do Verso Livre


7 - REFERÊNCIAS

ANDRADE, C. D. de. Bandeira a vida inteira. Rio de Janeiro: Edições Alumbramento, INL, 1986.
BANDEIRA, M. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1967.
http://www. casadobruxo.com.br/poesia/m/poetica/htm
http://www.infoescola.com/literatura/manuel bandeira
http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel Bandeira
http://www.pensador.uol.com.br/poema_de_manuel_bandeira
http://www.releituras.com/mbandeira - pasargada.asp
http://www.suapesquisa.com/biografias/manuelbandeira/

8 de fevereiro de 2012

O DEUSES PRIMORDIAIS NA MITOLOGIA GREGA

Caos, o princípio de tudo


No princípio era o Caos e sua força infinita, que consumia o Nada em sua própria indefinição. No choque das forças contínuas, espetaculares e inimagináveis, Aion produzia na eternidade o colosso que nem deuses nem mortais jamais testemunharam nos primórdios, e o vazio estava mergulhado em uma profunda desordem. O tempo, ainda, não existia; os seres etéreos também não existiam e tampouco os homens. O Caos reinava absoluto no vácuo e sua natureza rudimentar denunciava o princípio da existência imersa em todos os seres que dele adviriam. Por ser uma divindade solitária dos tempos imemoriais, o Caos, em sua dinâmica avassaladora e terrífica, gerou o primeiro dos seres: Nix, a Noite.


Nix, a Noite


Nix, junto com o Caos, torna-se, a despeito da Cosmogonia, a mais antiga das divindades. Deusa poderosa das trevas e portadora das forças misteriosas da espessa escuridão, de onde tudo se originara, Nix é considerada, para muitos poetas gregos, a mãe de todos os deuses, por acreditarem que a sua presença antecedeu a passagem da desorganização, no nada absoluto - o Caos -, para a formação gigantesca do Cosmo. Filha do próprio Caos, Nix tinha o poder de gerar outras divindades sem a necessidade de acasalamento. Assim, sozinha, nasceram dela o Sono, os Sonhos, o Momo, a Miséria e a Morte. Fora Nix que gerara, também, o implacável Destino, simbolizado pela Moira a que todos os seres estão submetidos.


Érebo, o deus das Trevas


Irmão gêmeo de Nix, Érebo fora concebido junto com sua irmã, que, também, representava as trevas. Desse modo, cumpre salientar que ambas as divindades descenderam do Caos e habitaram espaços singulares com a escuridão dos tempos primevos, antes da criação do mundo.  Com o aparecimento das divindades que representariam a Luz, Nix passou, então, a personificar a escuridão que está acima da Terra - Gaia -, e Érebo, por sua vez, encarnou as trevas profundas e eternas presentes no mundo inferior - o Hades. A escuridão, personificada em Nix, é, para os mortais, a Noite, que plasma a abóbada celeste, cobrindo a Terra como era nos tempos caóticos e dos seres sem essência; e a escuridão de Érebo é a manifestação mais dantesca do Caos, onde a luminosidade nunca penetrara e, conseqüentemente, jamais existirá em tão horrendo lugar, que é a morada dos mortos.


Éter, o Ar 



Hemera, o Dia


Da união entre Nix, a escuridão da Noite, e Érebo, a escuridão do mundo inferior, nasceram as duas divindades que emergiram das densas trevas  para trazerem a luminosidade ao mundo, que, até então, não existia. A saber: Éter e Hemera. O primeiro trouxe a luz rarefeita, superior e límpida, que paira sobre a atmosfera terrestre, radiando um brilho único e que envolve as mais altas camadas no céu próximo ao espaço sideral; e a segunda é, indubitavelmente, a personificação do dia em todo seu esplendor, rivalizando, assim, com a Noite, o seu lugar sobre a própria terra. A luz que todos os seres vivos necessitam para serem guiados e não se perderem nos caminhos tortuosos que a vida revela, ao longo da existência efêmera que o destino lhes confere.


Eros, o deus da Vida


A criação do mundo não seria possível se uma das forças primordiais mais intensas e complexas não existisse, e que, pairando na Eternidade, ao lado do Caos, engendrou o fenômeno da procriação, e, também, do nascimento de todos os deuses, entidades, semi-deuses, seres viventes e mortais; nos céus, nas águas e na terra: Eros. Sua singularidade o torna único no cenário da Criação, pois é através dele que todas as formas visíveis e não - visíveis conheceram a Vida. Eros é o deus que une todos os seres para que da ausência completa da essência à plenitude de seu fenômeno avassalador, a força da Vida se manifeste em sua forma imbatível, conferindo àqueles o  círculo da existência e sua continuidade, quer seja no plano terrestre quer seja no plano celestial. 


As Moiras, as fiandeiras do Destino


As mais dantescas das divindades e, por conseguinte, as entidades primevas e invencíveis no plano cosmogônico são as Moiras, que, também, eram chamadas de As Parcas. Juntas, elas representam o Destino - a Moira - contra o qual nem deuses nem mortais podem enfrentar. As  Moiras eram três irmãs cegas, que teciam continuamente o fio da vida, definindo, assim, o trajeto da existência  e o destino de todos os seres humanos. Cloto fiava a linha da vida dos humanos na terra, Laquésis, por sua vez, era quem determinava o valor e o conteúdo daquela, e, finalmente, Átropo era a  responsável pelo corte abrupto do fio da existência humana, trazendo, desse modo, a implacável morte para todos os homens e mulheres. Tudo estava sob o domínio das Moiras: os céus, a terra, os mares e os infernos.


Gaia, a mãe - terra


Admirável em sua natureza ímpar, a deusa Gaia emergiu do vácuo infinito, após o surgimento do Caos, e é a deusa mãe de todos os seres viventes e entidades que têm o fôlego da vida e o sopro espiritual. Gaia é, assim, a mãe de todos os deuses, gigantes e titãs; e de tudo que é vivente na terra. Gaia gerou Urano, a personificação do Céu, sem a intervenção de qualquer divindade, e com ele se uniu para completar os elementos de toda criação. A relação incestuosa de Gaia com Urano, seu próprio irmão, foi a causa do nascimento dos monstros: os Titãs, os Ciclopes e os Hecatônquiros como também da discórdia entre o casal primevo, culminando na morte de Urano quando um de seus filhos, o deus Cronos, comete o primeiro parricídio.


Urano, o Céu


Augusto por excelência, Urano, por ser a encarnação magistral de todo firmamento, cobria a mãe terra: Gaia. Assim, Urano gerou com Gaia muitos filhos e filhas, e teve, também, muitas irmãs. Reza a lenda que Urano odiava toda sua prole, e que, para que seus descendentes não fossem mortos por sua ira inexplicável, Gaia protegia-os, guardando todos no interior da própria terra. O seu egoísmo exacerbado provocou a primeira rebelião em sua linhagem direta, ocasionando o primeiro confronto entre os céus e a terra.  A partir da conjunção Urano - Gaia, inicia-se a gênese de todos os deuses e deusas olimpianas e suas implicações mítico-fabulosas na Grécia antiga e no mundo ocidental.


Tártaro, o mundo inferior


Habitando as camadas mais profundas e horrendas da terra, para além dos limites do Hades, estava o portentoso deus Tártaro, que, segundo a mitologia, é considerado por muitos um dos irmãos do Caos, e por outros uma divindade que emergiu do próprio choque das forças cosmogônicas nos primórdios. Tártaro teve relações com Gaia, que, por sua vez, gerou as mais hediondas bestas, que existem na mitologia grega. O mais temido pelos deuses fora o monstro Tifão. Tártaro personificava o limbo da terra em oposição absoluta aos céus - Urano - e representava, também, os termos do mundo: lugar para onde iam todos os seres condenados pelos deuses, i.e., o mundo inferior em forma de prisão eterna.


Pontos, o mar primordial


Nascido de Gaia sem que houvesse a união com outra divindade primordial, Ponto é o deus pré-olímpico do mar. Incestuosamente, Ponto e Gaia acasalaram-se, e esta concebeu Nereu, a entidade poderosa dos mares ou o legendário Velho do Mar, Talmas, que personificava os perigos e mistérios dos mares assim como outros filhos e filhas, que completam o rol das divindades marinhas. Ponto significa Alto Mar ou mar perigoso, sendo a primeira divindade que emergiu das águas - o mar primitivo - e irmão mais velho de Urano. Pontos engendra o líquido primordial da vida e detém as águas da morte, banhando, com seus rios nefastos, o próprio Tártaro.


Gaia e a concepção dos Óreas


Personificação dos montes e das montanhas na Antiguidade, os Óreas foram concebidos sozinhos por Gaia. São irmãos de Urano e de Ponto. Rústicos, cada monte e cada montanha tinha um deus que os representava na terra. Dos vários Óreas primordiais, alguns são notáveis na legenda mítica. A saber: Etna, que abriga o terrível vulcão homônimo, Citeron, que suportou a maldita Esfinge, em Tebas, na trágica estória de Édipo, Parnaso, berço dos poetas e morada das Musas, e o Olimpo, a morada suprema dos deuses.

3 de setembro de 2011

EM CENA VIRTUAL: ÁLVARES DE AZEVEDO


A CELEBRAÇÃO

Em 12 de setembro de 2011 serão comemorados os 180 anos de nascimento do expoente máximo do Ultra-romantismo nas letras nacionais: Álvares de Azevedo.

A TRAJETÓRIA CÍVICA

Manuel Antônio Álvares de Azevedo nasceu em 12 de setembro de 1831, em São Paulo, e morreu em 25 de abril de 1852, no Rio de Janeiro. O poeta romântico estudou Humanidades no Colégio Pedro II e integrou o corpo discente do curso de direito na Faculdade de Direito, em São Paulo.

Álvares de Azevedo, ao longo do curso de direito, destacou-se entre os demais por sua disciplina e competência. A grande parte de sua obra literária fora produzida no decurso da vida acadêmica. Entretanto, o desenlace prematuro do poeta, provocado pela tuberculose e agravado por um tumor, após uma queda de cavalo, retirou da cena literária nacional um jovem e promissor artista no frescor dos 20 anos de idade, que teve sua mocidade interrompida.

O poeta foi um exímio tradutor, e, por isso, traduzira a Parisina, de Lord Byron, o escritor inglês, que se tornou o ícone maior de uma geração considerada maldita - o mal du siècle - na qual a Morte se consolidara como ideal máximo da geração ultra-romântica, e que influenciaria, de forma contundente, a poesia de Álvares de Azevedo.